terça-feira, 5 de janeiro de 2010

ESCRAVOS DA ÁFRICA PARA O BRASIL 1793 - PARTE 03


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Na obra histórica e memorável de autoria do famoso Bacharel Luiz António Oliveira Mendes, graduado em Direito pela Universidade de Coimbra, em 1777, e ainda frequentador das Aulas de Filosofia e de Medicina, sob o título "MEMÓRIA A RESPEITO DOS ESCRAVOS E TRÁFICO DA ESCRAVATURA ENTRE A COSTA D'ÁFRICA E O BRAZIL", apreentada à Real Academia das Ciências de Lisboa- 1793, encontramos relatos interessantes, embora tristes, sobre a forma como foram tratados os escravos africanos em nosso País, a começar do transporte em navios negreiros, senão vejamos o que está registrado no livro acima mencionado:


" Há portanto pois anualmente um sem número de escravos transportados de toda a Costa da África ao Brasil; oarece que refolgando a humanidade oprimida, seria um dia de triunfo, de glória, e de prazer para a mesma humanidade, que escapando, a tantos perigos, entrava no Cristianismo, no cntro, e na unidade da Igreja: porém assim não sucede, porque não sei se diga, que o remanescente de seus dias é mais desgraçado.


Desembracada esta grande porção de escravatura na América, é conduzida para casa do comum senhor, que também o é do navio, e de toda a negociação. Ali para ser vista de todos, são escravos postos, e mandados assentar em lotes,e com separação dos grandes aos pequenos, das pretas maiores e menores, na rua pela frente da propriedade do senhor; e quando à noite se faz preciso ser recolhida escravatura, repousa em um grande armazém térreo, que fica por baixo da propriedade senhorial.


Quando esta porção de escravatura chega ao Brasil, consigo pensa, e bem, que entrando em terra prometida de abundância. e da fartura, nada lhe deve faltar; porém o contrário lhe sucede, porque por se querer liquidar a negociação pela menor despesa, a mesma escravatura se conserva sem novo vestuário; e encontra a economia de umas escassas rações. que o Capitão fez durar por providência para maior tempo da viagem: e na terra da abundância, onde tudo é barato, não se supre melhor a maltratada escravatura, que acaba de uma tão alongada viagem.


Neste suprimento não entram os senhorios dela, porque todo o seu fim, e intento vem a ser gastar pouco, e pôr fora com venda depressa a mesma escravatura: acometendo a esse tempo o maior número das enfermidades à escravatura, aos enfermos mandam às vezes persuadir pelos intépretes, quando saem para a mostra da compra, que digam aos novos senhores, que estão bons; ao que são fáceis, porque cuidam. que vão buscar melhor fortuna: de sorte que da cama do chão, aonde se acham gravemente enfermos, são levados, e passados aos compradores; e por conservarem por mais algum tempo o segredo da mentira até sucede, que pouco duram em poder de terceiro; e não dão tempo a serem refugados, e na frase da terra enjeitados, em observância da Ord. do liv. 4. tit. 17. no princípio, e no §.5., e 7.


Quando porém o lote da amostra se recolhe inteiro, porque nenhum dos escravos se comporara, ou se escolhera outro, que não seja o enfermo: torna a escravatura para o mesmo antigo lugar, e o enfermo por necessidade outra vez procura o solo térreo do armazém, que deixara, e se vai unir aos mais, que sofrem as mesmas, ou diferentes enfermidades.


Pela maior parte assim como vivem, morrem ao desamparo. Não se chama Médico por dois princípios, 1º porque há bastante dificuldade em visitar, e curar os Pretos; 2º porque pela paga, que o senhor há-de dar ao Médico, vem a escravatura a ficar mais cara. E o mesmo a respeito dos Cirurgiões. Assim a escravatura vai a ser entregue a uma alveitaria, qual é a dos Pretos sangradores, e estes são os que de ordinário são chamados, quando de dia em dia se vai sumindo, por efeitos da morte, a escravatura para debaixo da terra. Estes sangradores são os péssimos Cirurgiões, que embarcam para a Costa de Leste.


Uma cama no chão, uma comidas escassas, um fastio nascido da enfermidade, as mesmas enfermidades desamparadas, procurando a ultimação do homem escravo, o mauo trato em geral; são as coisas, que levam em cada um ano sem número de escravos à sepultura.


Manda-se em lotes passear pela Cidade a escravatura, para o fim de ser ela amostrada para a venda, e para a fazer participante de um novo ar, que a refaça. De caminho é ela levada ao mar, e aos lagos, tanques, e fontes, aonde algumas vezes se lava.

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